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  • 27 de Abril 2013

    Nü Sensae | 100 Leio

    Nü Sensae

    Não existe melómano neste mundo que negue a felicidade de se surpreender perante um disco capaz de mexer bem fundo com as suas expectativas, memórias e uma parte de si eventualmente esquecida. É um encontro raro e imenso ilustrado por ‘Sundowning’, obra punk suprema do ano transacto que colocou os Nu Sensae num campeonato mais amplo. Uma entrega pessoal que terá sido tão imediata quanto a música aí presente. Se noutros casos, a insistência pode levar à revelação de novas dimensões, por aqui a insistência reforça o impacto. E está lá tudo, a nú e a fazer-nos uma careta.
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    Há-que recuar ao píncaro da década de 90 para sentir uma viscelaridade semelhante. Por via das Babes In Toyland, dos Sonic Youth, dos Mudhoney ou dos Nirvana, ainda quando a dúbia nuvem do grunge se formava enquanto produto. Fale-se em revivalismo, até justificado, mas fale-se antes em devolver uma fúria ao rock, entretanto perdida – pelo menos nos moldes em causa. É certo que essa atitude se diluiu noutras estirpes e até noutros géneros; todavia, faz tempo que a mítica dinâmica power trio, baptizada por um grito de guerra feminino, não se impunha com tamanha grandeza. Mesmo que as Sleater-Kinney ou Magik Markers tivessem, com distinção, ousado tais desígnios.

    Na prática, os Nü Sensae resultam da lógica de caos organizado. Uma avalanche percussiva que se acotovela com a incisão da guitarra e puxa para si o mau génio do baixo, traduzindo-se nessa convivência fumegante que dá lugar ao efeito queda livre. Sem paragens contemplativas e em que o abrandamento rítmico não significa necessariamente perda de intensidade.
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    Se em estúdio provocam uma inegável convulsão sonora, em palco suscitam uma urgência colectiva incendiária. São conhecidos por actuações únicas e os diversos vídeos espalhados pela net comprovam-no. Trata-se de uma passagem da banda sem precedentes por cá, aberta a quem não tem nada a perder ou tem tudo a ganhar. Como os grandes desafios. NA

    + Info: TumblrSuicide Squeeze RecordsCríticaCríticaVídeoVídeoVídeo

    There isn’t a music lover in this world who can deny the happiness of the surprise before a record able to move deeply his expectations, memories and parts of himself eventually forgotten. It’s a rare and immense encounter, illustrated by ‘Sundowning’, supreme punk work that came out last year and put Sensae in a broader championship.
    It takes to go back to the pinnacle of the 90’s to feel a similar viscelarity. Like in Babes In Toyland, Sonic Youth, Mudhoney or Nirvana, even when the dubious grunge cloud formed as a product. We can speak up of revival, yet, even justified, but speak up before returning in a fury to rock, however lost – at least in this matter of question. Admittedly, this attitude was diluted in other strains and even other genres, however it has been a while until a mythical dynamic power trio, named before a female war cry, imposed with such greatness. Even if Sleater-Kinney or Magik Markers had, with distinction, such daring designs.
    Basically, Nü Sensae logic results as organized chaos. A percussive avalanche that elbows its way with guitar incision and pulls the temper from below, leading to coexistence inside the mist, in a free-fall effect. This all without any contemplative stops, wherein the rhythmic relaxation does not necessarily mean loss of intensity.
    If with the recording studio sound they cause an undeniable music convulsion, on stage they provoke a common incendiary pressure. They are particularly known for their unique performances and the videos can demonstrate that.
    We’re talking about the important transit of an unprecedented band, open to everybody who have nothing to lose and everything to gain. Like the biggest challenges.

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    100 Leio

    São necessários poucos segundos de ‘Gang$tar’ para dar de caras com um sonoro ‘foda-se!’, que o Lourenço (Nacho) atira para o meio do eco, antes de fazer as restantes apresentações de ‘Dama’, com doses iguais de respect e má onda. O primeiro álbum dos 100 Leio tinha apenas começado e já ali estava a mais importante palavra de todo o seu léxico da street: ‘foda-se’, vulgarismo tão versátil e eficaz como a fórmula do Lourenço (guitarra) e da Maria (bateria) para chegar a cada uma das suas songs.
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    Como se sabe, o ‘foda-se’ serve igualmente para aliviar a dor de quem acabou de entalar um dedo na porta. Depois de tantas vezes entalados entre comparações com os Sebadoh e alguma condescendência ligada ao facto de serem os mais novos membros da Cafetra, os 100 Leio aproveitam ‘Gang$tar’ para uma série de ‘foda-ses’ lo-fi, cuja pontaria certeira podia ser a de umas quantas rimas dos N.W.A., em discurso directo a partir de ‘Compton’. Convenhamos também que há qualquer coisa de player (ou playa) num duo, que nos deixa geralmente à espera de mais um enxerto de reverb e letras manhosas, mas que nos surpreende depois com umas quantas songs tão doces como namorar ao domingo e gostar dos mesmíssimos cinco filmes de merda.
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    Independentemente da referência no título do disco ser intencional ou não, a verdade é que também os Gang Starr eram dois e a dinâmica entre ambos melhorava substancialmente o jogo de cada um: as rimas do Guru só pareciam mais carregadas de realidade e rua, porque os beats do DJ Premier não esperavam sentados até que uma paisagem urbana se materializasse. A cooperação pura é uma das leis mais primárias num gangue. Talvez seja por isso que a bateria pouco refinada (mas boss) da Maria é a melhor companhia para a atitude ‘quero lá saber’ da guitarra shoegazeflow do Nacho. Back to back. Um pelo outro. Como primos que parecem irmãos. Miguel Arsénio

    .+ Info: Bandcamp | Vídeo

    Presentation of ‘Gang$star’ (Cafetra edition), record produced by B Fachada

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